Mas foi um poema recente de Benedetti que me trouxe até aqui. No livro"La Vida esse Paréntesis" lançado no Uruguai em 1997 e, até onde sei, ainda não traduzido para o português, está um poema chamado"Extinciones" em que o escritor alerta para algumas coisas que estão em perigo de extinção além de baleias e micos leões dourados. " Também enfrentam este perigo, as promessas, os hinos, a palavra de honra, os juramentos, a ética, a autocrítica."
Não resisti em fazer minha própria lista. Além da Mata Atlântica e da Floresta Amazônica, correm sério risco de extinção os jardins em frente às casas, e as próprias casas, e com elas
os animais de estimação. Em processo de extinção entraram o "por favor", o "obrigado", o "com licença" e o já desaparecido "desculpe". Em risco estão o "gosto muito de você", o "discordo de você mas aceito seu ponto de vista" e o "pode contar comigo". Segue preservado o "eu te amo", mas muitos deles respiram artificialmente.
Benedetti diz que os sem-teto estão prestes a ser extintos. Não só eles. Os sem-maldade, os sem segundas intenções e os sem-arrogância também. Em compensação, reproduzem-se em velocidade alarmante os sem-educação, os sem-humor e os sem-responsabilidade.
Pudor agora só em flash-back. A verdade também está sumida do mapa. A solidariedade ainda sobrevive, mas não anda solta nas ruas. Discrição, esqueça: nem em cativeiro.
Correm risco de extinção o ar puro, a praia limpa, o cinema feito de ideias e emoções, o beijo por razão nenhuma, os amigos de infância, o prazer de estar na estrada, os restaurantes que servem comida caseira feita na hora e o picolé de abacaxi, que não encontro em lugar algum.
Ficaram na saudade as cartas escritas à mão, os cursos de datilografia, as mulheres difíceis, o papo inteligente e os livros que você emprestou. E não ligue a televisão para ver programa de auditório no domingo, se quiser que seu estômago e cérebro não entrem na lista.
El rechazo al soborno/la cándida vergüenza de haber sido/e el tímido dolor de ya no ser. Se a poesia, ao menos, escapar do abate, nem tudo esta perdido.
Crônica de Martha Medeiros intitulada: Em perigo de extinção de Janeiro de 1999
El rechazo al soborno/la cándida vergüenza de haber sido/e el tímido dolor de ya no ser. Se a poesia, ao menos, escapar do abate, nem tudo esta perdido.
Crônica de Martha Medeiros intitulada: Em perigo de extinção de Janeiro de 1999
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